Resumo dos importantes resultados de pesquisas ocorridas entre julho e dezembro de 2006
A maior parte dos resultados de pesquisas aqui resumidos, baseiam-se na apresentação ocorrida em Londres, na conferência do capítulo Inglês do Parent Project, em 21 de outubro, e o restante em publicações e em muitas de minhas mensagens de correio eletrônico. Parte dessas novas informações reflete uma atualização relativa à reunião anual do American Parent Project Muscular Dystrophy, ocorrida em Cincinnati/Ohio/USA no período de 13 a 16 de julho de 2006. Esse relatório e todos os anteriores podem ser lidos e copiados de minha página na internet, cujo endereço é www.duchenne-research.com, em inglês, alemão e espanhol. Os nomes dos pesquisadores aqui mencionados não trazem seus títulos. E como de costume na
comunidade Duchenne, comumente são referenciados pelo primeiro nome. Quase todos são professores, e todos detém um título de PhD (catedrático), um MD (médico) ou ambos.
Teste clínico da técnica de salto de exon (exon skipping) na Holanda: Judith van Deutekom disse em Londres que quatro meninos portadores de Duchenne receberam uma injeção de 2O-methyl AON contra o exon 51, no músculo do tornozelo, tibial anterior, sem efeitos colaterais em nenhum dos meninos, e que uma biópsia foi efetuada em dois deles para verificar a formação de nova distrofina encurtada. Judith disse que esses resultados preliminares seriam “promissores”, mas que não poderia afirmar nada mais além disso. Ao final da apresentação Judith disse que deveríamos ser cautelosos, porque“nós ainda não alcançamos nosso objetivo”.
Mesmo que a técnica de “salto de exon” funcione em um dos meninos, isso não significa que ocorrerá da mesma forma nos outros. Apenas um diminuto volume de músculo foi tratado, e um tratamento assim localizado não é o que estamos necessitando. Um tratamento sistêmico é o que é necessário, que atinja todos os músculos, e isso somente é possível por meio de injeções de AONs na circulação sanguínea. Antes disso será testado no próximo ano o salto do exon 46 – sendo que precisaremos selecionar o AON correto e a melhor dosagem. “Mas chegaremos lá”, disse Judith.
Teste clínico da técnica de salto de exon (exon skipping) na Inglaterra:
Francesco Muntoni coordena os testes na Inglaterra, preparados pelo consórcio MDEX, no qual será usado um AON morpholino para saltar o exon 51 por meio de injeções locais no digitorum brevis, um pequeno músculo extensor do pé. Consultado por mim em 18 de dezembro, Francesco disse que já tem duas das três autorizações, e que tão logo a terceira permissão seja também obtida, o primeiro menino será selecionado. Isso ocorrerá provavelmente na primeira semana de março de 2007. Não serão liberados resultados preliminares. Mas depois que todas as informações coletadas tiverem sido analisadas, verificadas e aprovadas, elas serão liberadas. Caso o primeiro teste seja bem sucedido, o segundo estudo planejado terá início na segunda metade de 2007, e seu resultado estará disponível em 2008. Caso tudo progrida satisfatoriamente, a produção comercial em grande quantidade dos AONs e estudos clínicos de maior duração serão iniciados.
Os Morpholinos penetram no coração:
Até agora os AON morpholinos não puderam ser persuadidos a migrar para o interior dos músculos do coração dos camundongos mdx. Essa era uma forte desvantagem dos morpholinos usados pelos ingleses, quando comparados ao 2O-methyls que os holandeses estão trabalhando e que consegue produzir o “salto de exon“ também no coração dos camundongos.
Dominic Wells, em Londres, disse que os morpholinos conseguem penetrar no coração dos camundongos caso seja administrado em paralelo um agente de contraste chamado Optison, que são microbolhas de albumina, e ao mesmo tempo haja a aplicação de ultrasom proveniente de um equipamento para diagnóstico por ultrasom diretamente no coração. O ultrasom abre passagens na membrana das células musculares, e os morpholinos conseguem penetrar nas células. Quando o ultrasom é desligado as passagens fecham-se novamente. O salto de exon nos músculos esqueléticos não é alterado por esse procedimento. Levará muitos anos até que essa simples técnica possa ser utilizada a nível clínico nas crianças.
Salto de exon por transferência de genes na França: Eu já comentei sobre os experimentos da equipe de pesquisas de Luis García, em Paris, que conseguiu introduzir no núcleo das células musculares, genes para os AONs por meio de vetores virais – os AAV (www.duchenne-research.com). Sabia-se que com essa técnica era possível saltar o exon 23 de camundongos mdx que apresentavam mutação de ponto por ao menos um ano. Luis informou em Londres que agora isso também funciona em cães distróficos que estão bastante doentes e que tem aproximadamente a mesma quantidade de músculos que uma criança pequena. Mas esses cães apresentam uma mutação complexa, que somente pode ser corrigida efetuando-se um salto múltiplo dos exons 6, 7 e 8. E mesmo assim, funcionou! Entretanto os pesquisadores franceses não tinham uma quantidade suficiente do virus carregado com o U7-RNA e as seqüências de AON, para tratar todo o cão. Eles então bloquearam a circulação sanguínea em uma das pernas do animal e em 15 minutos injetaram em suas veias praticamente todos os 100 trilhões (1014!) de vírus preparados. Houve o surgimento de edemas, mas sem gravidade, pois em seguida os vírus migraram sem problemas para onde eles deveriam ir. Uma boa quantidade de distrofina nova e encurtada foi formada, que entretanto não distribuiu-se de forma equilibrada pelos músculos da perna, mas em quantidade semelhante à de pacientes com Becker. E após seis meses ainda estavam lá! Agora, um teste clínico fase-I com meninos portadores de Duchenne está sendo preparado em que será saltado o exon 51. Um tratamento como esse, usando vetores virais, provavelmente necessitará de imunossupressão.
Luis e seus colegas também estão tentando uma combinação desse tratamento com uma transferência semelhante de genes, na qual o gene para a miostatina será bloqueado. Isso já foi testado em camundongos, todavia com pouco sucesso, pois eles regeneram os músculos rápido demais. Agora será tentado em cães. Os resultados serão informados no próximo ano.
Teste clínico com transferência de genes nos EUA: Scott McPhee da Asklepios – Carolina do Norte, que em conjunto com Jerry Mendell – Columbus/Ohio iniciou um estudo com a técnica de transferência de genes de mini-distrofina com vetores AAV, disse-me em 21 de dezembro que quatro dos seis meninos participantes já receberam sua injeção de Biostrophin nos músculos biceps. O quarto menino já pertencia ao segundo grupo de três meninos que receberam uma alta dose de vetores. Não foram detectados efeitos colaterais adversos sérios até o momento. Os resultados preliminares estarão disponíveis, sem atrasos, em meados de 2007, seguidos não muito mais tarde pelos dados detalhados finais.
Ignorando a mutação de ponto com a PTC124. Richard Finkel, da empresa PTC /Nova Jersey, apresentou em Londres detalhes do teste clínico com o composto PTC124. Essa nova droga, cuja composição é mantida em segredo, pode ser administrada em comprimidos. No teste clínico fase-II, agora já finalizado, com 26 meninos portadores de Duchene que apresentam mutação de ponto e que receberam doses de 18mg/kg/dia e 40 mg/kg/dia da droga por quatro semanas, análises detectaram a aguardada distrofina de comprimento normal. Nesse estudo, e como no teste fase-I anterior, não ocorreram efeitos colaterais. Mas os níveis da nova distrofina eram baixos demais para produzir um efeito terapêutico suficiente e confiável. Todavia será iniciado um outro teste fase-II com 12 meninos portadores de Duchenne, em que receberão 80 mg/kg/dia de PTC124 para alcançar uma concentração de pelo menos 10 microgramas/ml no soro sanguíneo. Os dados finais serão publicados em 2007. Então estudos de longa duração serão efetuados, variando de três a seis meses. É importante compreender que se todos os testes clínicos resultarem satisfatórios, essa forma de tratamento será de fato uma cura, porque a nova distrofina terá quase o comprimento normal e não será uma distrofina tipo Becker, como a esperada na técnica de “salto de exon”. Por outro lado, apenas 10 a 15% dos meninos com Duchenne podem se beneficiar de um tratamento com a PTC124, os quais apresentam uma mutação de ponto. Dessa forma, é necessário conhecer o tipo exato de mutação para todos os meninos com Duchenne.
Mesoangioblastos “fazem cães lesionados correrem novamente” (tais palavras foram usadas nas manchetes de alguns jornais). Esse foi o efeito produzido por células tronco derivadas da parede de vasos sanguíneos, e que trouxeram uma fantástica melhora funcional em cães distróficos, conforme Giulio Cossu e seus companheiros de trabalho em Milão informaram na edição de 30 de novembro da revista Nature.
Essa publicação, e um comentário de Jeffrey Chamberlain, podem ser obtidas comigo por e-mail. Giulio escreveu-me em 9 de dezembro dizendo que enviará provavelmente em fevereiro, informações quanto a seu trabalho de isolar essas células tronco do tecido dos vasos sanguíneos embrionários humanos. Adicionalmente ele descobriu uma outra eficiente droga, mas não pode tecer comentários no momento.
Aumento da utrofina: Kay Davies da Universidade de Oxford e Jon Tinsley da empresa Vastox, Oxford, informaram em Londres que após testarem automaticamente cerca de 13.000 compostos, foram selecionados 100, capazes elevar os níveis de utrofina nas culturas de células. Alguns desses compostos poderiam mais do que quadruplicar os níveis. Eles serão otimizados posteriormente. O tratamento de camundongos mdx com o composto VOX 185 poderia elevar os níveis de utrofina quase que exclusivamente em músculos, atuando em seu promotor-A, e assim obter uma melhora significativa de suas funções. Outros experimentos com camundongos já haviam demonstrado que uma elevação de duas a três vezes nos níveis de utrofina provocavam efeitos erapêuticos significantemente melhores, e espera-se alcançar uma elevação de cinco a sete vezes nos níveis de utrofina com uma versão otimizada da droga VOX 185. Em meados de 2007 uma droga potencialmente efetiva poderia estar pronta, e que seria dada sob a forma de tabletes para alcançar todos os músculos. Então todos os testes clínicos necessários serão efetuados nos próximos anos.
Inibição da Myostatina: A empresa Wyeth Pharmaceuticals, dos EUA, em um teste clínico fase-I-II, já testou o anticorpo MYO-39 em 108 pacientes adultos portadores de doenças musculares, alguns deles com Becker. Os testes já estão completos e os resultados – que parecem positivos – serão publicados na primavera de 2007.
Tranferência de Mioblastos funciona novamente: No final de setembro, Jacques Tremblay, da cidade de Québec, no Canada, enviou-me informações detalhadas com respeito a seu novo experimento envolvendo a técnica de transferência de mioblastos, que seria melhor chamada de “transferência de células miogênicas“, para diferencia-la das maquinações de Peter Law. Em um teste clínico com 9 pacientes com Duchenne, ele pôde mostrar que em 8 deles foram criadas até 26% de fibras musculares contendo distrofina normal, após terem sido injetadas células miogênicas normais de um parente. As células foram injetadas a uma distância de apenas 1 a 2 mm entre elas, em uma pequena área de um músculo do tornozelo. No momento está sendo planejado um segundo estudo, em um músculo onde se possa demonstrar facilmente que houve uma melhora funcional. Essa transferência celular teria algumas vantagens, dentre elas: a nova distrofina teria o comprimento normal e estaria sob controle de suas sequências de controle normais; o efeito positivo seria de longo prazo; evitaria-se problemas de imunidade; a técnica poderia ser combinada com a inibição da miostatina; e mais importante, poderia ser útil a portadores de Duchenne com mais idade.
Guenter Scheuerbrandt, PhD., Im Talgrund 2, D-79874 Breitnau, Germany
Esse sumario foi escrito em 21 e 22 de dezembro de 2006. Aqueles que já não estiverem em minha lista de endereços mas que desejem receber todos os meus futuros relatórios de pesquisas e entrevistas via e-mail, façam a gentileza de enviar seu endereço de e-mail para gscheuerbrandt@t-online.de.
Tradução para o português:
Marcelo Dessen Padilha de Oliveira
Acadim – Associação Carioca de Distrofia Muscular
Rio de Janeiro – RJ – Brasil
E-mail: acadim@acadim.com.br
Web: https://acadim.com.br