Cuidados respiratórios -Ventilação em Doenças Neuromusculares- Entrevista com o Dr. Jerold Reynolds, terapeuta respiratório da Universidade Estadual de Ohio

24 de agosto de 2017 by Izabel Gavinho

Dr. Jerold Reynolds, terapeuta repiratório da Universidade Estadual de Ohio, fala sobre a sua experiência no tratamento de doenças neuromusculares com utilização do método de ventilação não invasiva -Transcrição do chat da MDA – Associação de Distrofia Muscular dos EUA (Edição nº. 13)

Ventilação em Doenças Neuromusculares

Transcrição do “chat” da MDA (Associação de Distrofia Muscular – EUA)
Entrevistado: Jerold Reynolds, Ph.D., R.T.
Dr. Reynolds é terapeuta respiratório na Universidade Estadual de Ohio há 25 anos. Ele atualmente é membro do corpo docente do Departamento de Neurologia da Universidade Estadual de Ohio e possui um consultório particular onde atende principalmente pacientes neuromusculares. Juntamente com dr. Steven Nash, dr. Reynolds dirige a clinica ALS da Universidade Estadual de Ohio. Tem atividade em pesquisa médica bem como atendimento ao paciente. Seus trabalhos têm sido publicados em vários jornais de medicina e foi indicado ao Prêmio Lawrence A. Rand por seu trabalho com ELA.( Esclerose Lateral Amiotrófica).
Anfitrião:Dan Stimson, Ph.D, Escritor de Ciência Sênior da MDA

Quais as desvantagens de esperar para começar ventilação não invasiva, particularmente em ELA?
DR. REYNOLDS — 
A desvantagem é a recorrência de infecções respiratórias devido ao acúmulo ou estagnação de muco. Isso pode levar a muitas visitas ao consultório médico ou ao hospital e uma queda na qualidade de vida do paciente. Ventilação não invasiva é uma excelente ferramenta na prevenção de infecções respiratórias em pacientes com ELA e essa é a razão pela qual normalmente inicio meus pacientes em VPAP ( pressão aérea positiva variável) quando a capacidade de força vital cai para 70% ou menos do que seus valores normais prognosticados.

Que sugestões você tem para conseguir um  ajustamento confortável para o uso do BiPAP durante a noite?
DR. REYNOLDS — 
Certifique-se de que o equipamento fique adequadamente ajustado ao paciente e comece cedo. Não espere até que haja emergência. Eu oriento à maioria dos meus pacientes para fazerem duas semanas de uso gradual e progressivo antes de usar o aparelho durante toda a noite.

CPAP não é normalmente bom para pessoas que tem doenças neuromusculares?
DR. REYNOLDS — 
CPAP é ótimo mas não para pacientes com doenças neuromusculares. O CPAP aumenta o trabalho de respirar e isso pode ser letal para um paciente com doença neuromuscular.

Você prefere ventiladores a volume ou BiPAP, para uso prolongado?
DR. REYNOLDS — 
Um ou outro pode ser adequado  para uso prolongado. O importante é o motivo pelo qual você está escolhendo um aparelho em particular. Qual a escolha que lhe dará o melhor resultado ? Muitas pessoas presumem erroneamente que os ventiladores a volume são apenas para ventilação invasiva e esse não é o caso. Há necessidade de uma avaliação muito cuidadosa de questões sociais bem como físicas antes que essas decisões sejam tomadas.

Há um consenso entre os médicos a respeito de como tratar problemas respiratórios que vem com tipos específicos de doença neuromuscular (DNM)?
DR. REYNOLDS — Não, não há. A visão de que é melhor ser precoce e começar cedo o tratamento está certamente crescendo. Muitas pesquisas estão agora sendo feitas em DNM e questões de cuidados respiratórios. Acho que a visão está mudando na comunidade médica geral, e existe muito o que pode e deve ser feito.

Para uma pessoa com problemas respiratórios progressivos, quando é o momento para fazer a mudança de ventilação não invasiva para a traqueostomia?
DR. REYNOLDS — Essa é verdadeiramente uma pergunta difícil. Vou dar a você uma resposta muito simplificada: a mudança deverá ocorrer quando o nível de dióxido carbono do paciente e as secreções estão muito difíceis de controlar e a qualidade de vida é inaceitável para o paciente.

Por que as secreções pioram com ventilação não invasiva?
DR. REYNOLDS — 
As secreções não deveriam piorar com ventilação não invasiva, a menos que o equipamento que esteja sendo utilizado não esteja limpo ou esteja contaminado por bactérias. O que acontece, às vezes, é que o peito do paciente faz um ruído logo após iniciar a assistência pressão com pressão positiva. Nestes casos  o que acontece é que o paciente movimenta muito mais ar e também as secreções que estão estagnadas em seus pulmões. Isto cria um barulho ou um som de respiração anormal. Com o volume acrescido de ar agora sendo movimentado, as secreções podem efetivamente ser eliminadas das e a probabilidade de uma infecção é drasticamente diminuída.

Por que traqueostomias são às vezes melhores que ventilação não- invasiva?
DR. REYNOLDS — 
Às vezes a ventilação não-invasiva não pode prover suficiente volume de ar e ou pressão para efetivamente ventilar um paciente severamente debilitado. É nesse momento que ventilação mecânica invasiva deve ser considerada com a inserção de um tubo na traquéia. É muito mais fácil prover total ventilação através de uma traqueostomia porque a interface entre paciente e máquina é muito mais eficiente.Você pode facilmente prover total controle da ventilação com um ventilador e tubo na traquéia enquanto nem sempre acontece com métodos não invasivos. Ventilação mecânica pode ser uma grande benção para ambos, paciente e médico. Isso entretanto é um assunto muito individual para famílias e pacientes e deve ser examinado com grande atenção antes de a decisão para traqueostomia seja tomada.

Há uma marca do aparelho BiPAP que você poderia recomendar? Além disso, qual o melhor lugar para adquirir um aparelho desse tipo?
DR. REYNOLDS — 
Você precisa de uma prescrição médica para conseguir um BiPAP. A maioria dos produtos atuais são muito bons e a tecnologia está constantemente melhorando. Recomendo que o equipamento venha de um vendedor de equipamento médico durável e de boa reputação, que possa acompanhar o paciente e disponibilizar assistência e serviços quando necessário.

Meu irmão que tem 21 anos tem DMD. Que cuidados respiratórios ele precisa tomar (e em qual estágio) a fim de que problemas possam ser evitados?
DR. REYNOLDS — 
É muito importante em DMD que o paciente passe por uma reabilitação ainda cedo a fim de prevenir problemas respiratórios. Coisas como exercícios de incentivo a respiração são essenciais para prevenir complicações respiratórias.

Meu irmão com DMD entrou em coma por causa de congestão em seus pulmões. Ele foi privado de oxigênio por aproximadamente 10 – 15 minutos e permaneceu em coma por 10 dias devido a infecções em seus pulmões. Por que você acha que ele estava indo bem e de repente desenvolveu infecção e gripe? Às vezes ele mostrava sinais de recuperação, mas outras vezes não.
DR. REYNOLDS — É importante realçar a necessidade da saída do muco em pacientes DMD. Se isso não for feito, a secreção fica estagnada e infecções  ocorrerão. É importante trabalhar com pacientes como seu irmão cedo e educá-los a respeito de como e quando a progressão de suas doenças afetarão a respiração deles. Normalmente se essa medida for tomada, hospitalizações como a de seu irmão podem muitas vezes ser evitadas.

Quais os passos das precauções necessárias para que uma pessoa com DMD prevenir ou diminuir problemas respiratórios no futuro?
DR. REYNOLDS – 
Falando claramente, qualquer exercício de respiração profunda ou intervenção como o BiPAP pode ajudar o paciente a super expandir a parede de seu peito e aumentar a eficácia da ventilação. Isto reduz o trabalho de respiração e descansa os músculos respiratórios. Diminui, também, o número de infecções respiratórias através da limpeza efetiva do muco. Eu tenho uma opinião convicta de que a terapia preventiva é mais efetiva a longo prazo. Normalmente se pacientes com DMD estão conscientizados das complicações futuras provenientes da fraqueza muscular, então eles podem tentar preveni-las.

COMENTÁRIOS:  

1 – Eu tenho DMD, uso ventilação não invasiva e nunca tive problemas. Eu também tenho CoughAssist (*), entretanto tenho tido sorte o bastante de não precisar usá-lo por um bom tempo. (*) aparelho que auxilia a função da tosse.

2 – Eu uso BipAP desde o final de minha adolescência, até que eu passei por uma traqueostomia às vésperas do meu 21º aniversário. Funcionou comigo, mas eu me dou conta de que esse não é o único caminho a seguir.

PERGUNTA —  A partir de que idade devemos começar a usar suporte ventilatório como BiPAP?
DR. REYNOLDS — 
Eu uso bastante o BiPAP em meus pacientes. O início da terapia depende do tipo de DNM com o qual eu esteja trabalhando . Tipicamente as DNMs de evolução mais rápida precisam de uma intervenção mais cedo com pressão positiva em vias aéreas.

PERGUNTA — Você acredita que a prescrição de antibióticos para pacientes com DMD ou doença neuromuscular, antes deles estarem realmente doentes, é uma boa idéia? (Por exemplo, quando uma garganta inflamada ocorre).
DR. REYNOLDS — 
Antibióticos são vastamente usados e em demasia, quando deveriam ser usados criteriosamente. O melhor seria fazer um exame de cultura primeiro quando se está tratando  uma infecção respiratória e, caso  isso não seja prático, então o paciente deve ao menos apresentar sintomas como febre persistente antes de se começar a terapia com antibióticos.

PERGUNTA —  Entendo certamente que antibióticos são usados muitas vezes em demasia, mas para infecções crônicas com DMD, não deveríamos cuidar delas de forma mais agressiva antes que problemas mais sérios se desenvolvam?
DR. REYNOLDS — 
As complicações de doença neuromuscular devem ser combatidas a partir de diagnóstico e o cuidado preventivo deve ser prontamente iniciado.

PERGUNTA —  E a respeito dos medicamentos que para encurtar gripes, a exemplo do  Zicam.  (No Brasil temos o tamiflu) eles podem ser usados?
DR. REYNOLDS — 
Minha experiência e conhecimento sobre essas medicações são muito limitados para comentá-los com autoridade.

PERGUNTA —  Pessoas com DMD que eu encontro “online”, em seus 40 anos, não acham que genética tem muita a ver com a idade de início da progressão respiratória em DMD. Que você acha?
DR. STIMSON — 
Na verdade, eu acho que provavelmente há alguma correlação entre genética e idade de início de DMD. Lembre-se, DMD e Becker MD são na verdade a mesma doença, causada por diferentes mutações na distrofina.

PERGUNTA — Tenho um filho de 22 anos de idade com DMD. Ele usa LTV 800 sob forma não invasiva durante o dia e BiPAP à noite. Ele freqüentemente fica 8 segundos sem respirar durante a noite. Isso é normal?
DR. REYNOLDS — 
Não, isso não é normal. A causa mais comum da apnéia do sono em pacientes com DNM é a obstrução causada por fraqueza muscular. Se o aparelho de ventilação usado está adequadamente instalado, essa obstrução não deveria ocorrer.

PERGUNTA —  Em sua experiência, quanto tempo ventilação e alimentação através de tubo estenderá a vida de um bebê com SMA tipo 1?
DR. REYNOLDS – 
A alimentação através de tubo e ventilação estenderão muito a duração e qualidade de vida de uma criança com SMA 1.

  1. STIMSON — Dr. John Bach da Faculdade de Medicina e Odontologia de Nova Jersei em Newark acredita  que crianças com SMA tipo 1 podem viver por muitos anos com ventilação. No ano passado, ele publicou um estudo descrevendo vários pacientes com SMA 1 com idade entre 8 e 19 anos, que parecem estar indo muito bem com suporte ventilatório. [Observação: mais detalhes em http://www.DoctorBach.com]

PERGUNTA —  Tenho distrofia muscular de Duchenne e, apesar dos meus esforços, normalmente minhas gripes rapidamente evoluem para pneumonia. Que tratamento e, claro, prevenção você recomenda para gripes?
DR. REYNOLDS — 
Não suporto ser redundante, mas a terapia preventiva que está sendo discutida aqui deve ajudar bastante.

PERGUNTA —  Não consigo encontrar um bom pneumologista que conheça doenças neuromusculares. Meu diagnostico não está exato, talvez possa ser miopatia mitocondrial. Eu localizei um que trata pacientes com ELA. Que você acha?
DR. REYNOLDS — 
Entre em contato com o escritório local de MDA para conseguir uma lista de médicos.

Observação: Você pode encontrar seu escritório local de MDA emhttp://www.madausa.org/

PERGUNTA —  Na CNN vi  Mattie Stepanek, um jovem brilhante e Embaixador da Boa-vontade Nacional das MDAs, portador da doença disautonomia mitocondrial e usa um ventilador. Indivíduos afetados por  desordens mitocondriais ou metabólicas usualmente requerem ventilação ou outro suporte respiratório ?
DR. REYNOLDS — 
Em minha experiência, a maioria não requer ventilação mecânica. Entretanto, eu tenho vários pacientes similares que requerem assistência com ventilação positiva em vias aéreas.

PERGUNTA —  Sou enfermeira e trabalho com um homem jovem com ALS (esclerose lateral amitrófica), que usa ventilador 24 horas por dia 7 dias na semana e sofre de sinusite e problemas de ouvido. Ele está sendo tratado com antibióticos e faz drenagem 3-6 vezes por dia. Sucção oral tem sido usada porque ele não consegue engolir. Alguma idéia?
DR. REYNOLDS — 
Sim, muito pode ser feito a respeito de problemas de sinusite. Corticosteróides nasais sob forma de sprays são o que eu normalmente uso. O segredo é conseguir ter o paciente em tal posição que a medicação possa efetivamente escorrer para a área do seio. A hidratação do paciente também é um ponto fundamental Eu apenas experimento descongestionantes como último recurso uma vez que eles podem também tornar as coisas muito piores.
COMENTÁRIO — Acabamos de tentar “Flonase” (No Brasil temos o flixonase) e “Atrovent” por 6 dias e não houve alívio.

  1. REYNOLDS — A cabeça do paciente estava baixa quando o spray foi aplicado? Quando o paciente não consegue uma adequada respiração profunda e aspirar a medicação para dentro da cavidade do seio paranasal a medicação pode não ser efetiva. Você acha que a medicação estava chegando à área a ser tratada?
    RESPOSTA – 
    Ele estava em um ângulo de 45 graus e ele sentiu que o spray estava adentrando seu nariz, mas talvez possamos experimentar colocá-lo ainda mais para baixo.DR. REYNOLDS — Parece ser uma boa idéia. Também, se possível, aumente a hidratação de seu paciente
    Tradução: Rita Portela

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